quinta-feira, 19 de junho de 2008

Literatura de Entranhamento II

Eu quero a literatura de imponência, não a de esmoladores indecentes,
como a atual brasileira, em sua maioria. Não vou ler mais nada por apadrinhamento, por
por companheirismo, por notícia. Não vou dar mais vazão à literatura do minguado-proposital, que estraga a potência de nossa arte.
Agora é tudo na base de quem merece.
Quem se atrever que ao menos tente se igualar a Dostoievski, Borges e João
Cabral de Melo Neto. É preciso contribuir, não inchar.
O tempo do café-com-leite acabou.




quarta-feira, 11 de junho de 2008

Literatura de Entranhamento

Por que estar atualizado nas letras, acompanhar exatamente cada um que se lança aqui & agora? Por que estar hoje à noite no evento da Braskem, comprar três livros de três novíssimos autores? Às vezes, como nesse instante, me soa uma obsessão banal, mais focada no puro andamento do que acontece do que a verdadeira preocupação com a feitura de nossos escritos. Pode vir para o bem, a garimpagem pode encontrar alguém que se engaje genuinamente no que faz, mas acaba que tentar demais catar o presente é dar atenção e valor a quem não merece. Para mim, uns 80% dos autores brasileiros de agora não fazem nem a metade do caminho do que seria, como posso chamar, a Literatura de Entranhamento. Nem parecem, na verdade, dispostos a superar isso. Preferem a coisa fácil, miúda, fazer uns trocadilhos. Preferem saber se escrevem bem, estilisticamente bem e só. Preocupações tolas, como se vai polemizar, se se vai agradar, se vai romper um novo tratamento de linguagem. Isso é o que há de mais fraco na literatura, é o que menos importa. A literatura é feita por pulsão de vida, e a vida é um absurdo, caralho, como é um absurdo estar vivendo, mas mesmo assim os novos autores parecem que escrevem como se ela já fosse comum. Leio e sinto apenas a textura do papel do livro, o baile das palavras, mas não como é completo o absurdo de estar aqui, de ter passado do microcosmo inválido para a célula, de então respirar, me alimentar, querer alguém do meu lado, ter crises e rumar invariavelmente para a morte. Escrevem como se não fossem morrer. O escritor que enalteço não, sabe bem o tamanho da morte que lhe virá e mesmo assim escreve. E esse, o Grande Escritor, como tantos, e citar nomes pode até soar como uma comparação falaciosa aos novos executores das letras, não escreve apenas para seus pares, não se diverte como quem solta confetes ao fazer o que faz, não fala apenas sobre o "cotidiano" ou um genérico de "condição humana" (quase todas as orelhas citam essas duas palavras? é, talvez não saibam muito bem do que falar), mas é aquele que descerá ao purgatório, ao inferno, numa missão dantesca, até achar a beleza de sua musa ao lado do trono eterno. Vai caminhar, entender-se, escrever, como quem não separa nada disso, como se tudo fosse a mesma matéria maciça de viver, e, principalmente, como quem escuta o tic tac da bomba.

sábado, 7 de junho de 2008

O Entendimento


Às vezes, alguma pessoa ou livro me faz redescobrir o não em mim. O não, você ainda não está pronto, o não, você não entende tanto quanto gostaria. E vejo que meu entendimento nada mais é que alguns punhados de referências, palavras-chaves ditas em momentos oportunos, conhecimentos que não sabem se conectar uns com os outros senão grosseiramente. É pegar um entendimento meu, aproximar com zoom e ver que em vários pontos as tessituras estão sem elos, que as lacunas são vergonhosas, que são várias manchas num pano branco, sem unidade. Mas isso de maneira alguma me aflige ou me promove uma piedade de mim mesmo. Dá sim uma força imensa, uma vontade de poder, um sentido de vida que quer ser vivida para empreender os laços que faltam. E é imprescindível buscar tudo ao redor para entender – a História, as Artes, a Filosofia, as conversas de bar, as tonalidades do amanhecer. Entender é notar como se mover a si próprio por entre as coisas, é saber se posicionar na ordem de todos os outros movimentos existentes. A metade do eu de um homem é o mundo inteiro. Se ele quer se entender, que entenda todo o resto. Já dizia o "conhece-te a ti mesmo" do helenismo, que não é só um saiba quem você é, mas um saiba qual o seu lugar no cosmos, enquanto homem. Que segue.

domingo, 1 de junho de 2008

Alonso Delbero

Alonso Delbero era meu tio-avô, porque se fez irmão do pai do meu pai. Além de meu tio-avô, Alonso era médico-clínico, porque batia com martelo em um joelho para ouvir dizerem “33”, ou quase isso. Além de médico-clínico, ele era escritor. Porque não se sabe, mas também não se discute. Era o escritor da família e realizavam glamorosos brindes em homenagem. Nunca publicou uma nota além de duas ou três crônicas num jornal de quarenta anos pra trás, que nem mesmo ele guardou os recortes. E foi só numa conversa de canto de festa que Alonso revelou a mim sua intenção literária: um escritor nunca-lido é sempre um escritor agraciado pelo infinito de possibilidades, sua obra é sempre um “seria” que pode acoplar qualquer-coisa, inclusive o sublime. Bem melhor ser talvez um gênio do que um convicto fracasso.

- Me diz aí, tio, uma frasezinha que seja... feita por você.

- Só entre nós, viu? Não vá contar por outros cantos – pigarreou antes de falar – Meu melhor verso é:

Aproveitou o ruído de um prato que se quebrava no meio da sala e o meu virar de rosto automático para escapar e entrar no banheiro de visitas. O infarto em cima da privada foi instantâneo.

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homenagem a tantas autoridades a quem nos referimos com saliva e gosto bom na boca, sem ao menos colocá-las contra a parede uma vez.